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    FRANZ KAFKA (1883-1924)


               APOIADORES     


 


                                                                   Arte: Adriana Peliano                                                               


            

    

A Acusação - Sinopse


“A Acusação” é um espetáculo teatral multimeios que se propõe a contar a história de Josef K., um personagem anônimo que de repente se vê acusado e envolvido nas tramas de uma justiça sem rosto por motivos que ele mesmo desconhece.

O espetáculo integra dança e movimentos cênicos à ação dos atores, que manipulam bonecos e circulam por um cenário móvel, composto de portas, escadas, adereços cênicos e estruturas metálicas que nos remetem à verticalidade da arquitetura urbana, desvendando as tentativas de Josef K. para se ver livre da burocracia judicial.

A música eletrônica inspirada em temas de Bernard Herrmann (dos filmes de Hitchcock) nos remete a um clima de suspense e inquietação.

Nesta encenação os atores falam, gritam, sobem e descem escadas, saltam das alturas, correm por passarelas, escorregam em rampas reforçando a situação de Josef K, um personagem atônito e sujeito a uma contínua perseguição.

 

A Acusação

        O Grupo Oficcina Multimédia estreou Belo Horizonte sua nova montagem – A ACUSAÇÃO, uma livre adaptação de O Processo, de Franz Kafka, com direção de Ione de Medeiros. Esse espetáculo alterna diferentes linguagens artísticas em uma encenação multimeios, que reúne atores, dança, material cênico, texto, e, ainda, mantém a permanente proposta do Grupo de integrar as artes. A ACUSAÇÃO pretende revelar um mundo regido pela papelada viva da burocracia e pelas leis que vigiam uns e são ineficazes para outros. Em algumas


Em 1984, a Oficcina Multimédia produziu o espetáculo "K", montagem que levou para a cena música ao vivo, adereços circenses, trapézio e pernas de pau para dividir com o público a temática da repressão, passando por vários contos de Kafka.
Em 2005, com a montagem de A Acusação, o grupo retoma a obra deste autor e busca em O Processo a base para contar a história de Josef K, um homem comum que, detido injustamente, vê-se de um dia para o outro engolido por uma engrenagem judicial arbitrária e inverossímil.


No espetáculo atual, as cenas se desenvolvem em um cenário que reflete a arquitetura de uma paisagem urbana, com linhas verticais e longas diagonais, vias de acesso aos “box contemporâneos” – habitações miniaturizadas – que enfatizam a verticalidade típica das grandes metrópoles. Em algumas cenas, bonecos interagem com os atores, para representar a manipulação das pessoas pelo sistema.

Segundo Ione de Medeiros, este complexo de formas que se entrecruzam em múltiplas combinações, é constituído por uma série de estruturas metálicas, presentes nos cubos superpostos, nas passarelas suspensas, nas escadas, nos cabos de aço, nas roldanas, cujas proporções agigantadas com o objetivo de evidenciar a supremacia da matéria e o achatamento do indivíduo dentro da atual engrenagem social.
“Enquanto os atores manipulam e transitam pelo cenário com sua profusão de escadas, altas passarelas e rampas escorregadiças,subindo e descendo, ou correndo de um lado para o outro, desmantela-se a máquina repressora, latente nos diversos segmentos de nossa estrutura social. Nosso objetivo também é inserir na cena um caráter lúdico e divertido, contrapondo à sisudez da burocracia e às tensões dos corredores judiciais diante dos quais somos todos impotentes”, comenta Ione de Medeiros.
A diretora lembra que para assimilar Kafka, não bastam as cenas nem as palavras. O espectador tem que se desprender da realidade “morna” e se deixar levar por um certo clima que situa a ineficácia da Justiça e a burocracia exagerda presentes no dia a dia, objetos kafkianos típicos. “O público tem que se deixar envolver por esse universo”, recomenta Ione.


Estréia Nacional – A ACUSAÇÃO fez sua estréia nacional no 3º Festival do Teatro Brasileiro – Cena Mineira, realizado no mês de setembro de 2005 em Brasília/DF, no Teatro Nacional.
O espetáculo conta com o importante trabalho do DJ paulista, Paulo Beto da ANVIL FX que se inspirou em Bernard Herrmann( foi quem fez a trilha dos filmes de Hitchcock )para criar os climas densos da narrativa e do discurso, e um certo humor sarcástico, característicos das obras do autor. A música acompanha o personagem no seu discurso dramático, e reforça a melancolia de um condenado sem nenhuma chance de se salvar.


A iluminação de Davi Brito (com assistência de Richard Zaira e Joana D’Arc) também atua dramaticamente enfatiza as sombras, promove deformações, amplia figuras, adensa volumes e multiplica formas que reforçando o caráter ilusionista da encenação.


 

 

FICHA TÉCNICA

Direção, figurino e cenário

Ione de Medeiros

Assistência de Direção

Jonnatha Horta Fortes

Assistência Cenográfica

Francisco Cesar

Elenco

Escandar Alcici Curi
Fábbio Guimarães
Henrique Mourão
Jonnatha Horta Fortes
Leandro Silva
Lúcio Honorato

Preparação Vocal e Corporal

Leandro Acácio e Jonnatha Horta Fortes

Execução cenográfica

Cícero Plácido Teixeira

Trilha sonora

Paulo Beto - Anvil FX

Programação visual

Adriana Peliano

Iluminação

Davi de Brito Alves

Assistente de Iluminação

Richard Zaira e Joana D’Arc

Fotos

Guto Muniz

Produção

Grupo Oficcina Multimédia


 

Informações sobre o autor

    "Não pude lê-lo (Kafka), o espírito humano não é
suficientemente complicado para compreendê-lo"

                                                              
                                              Albert Einstein

           "Kafka é o maior escritor clássico deste tumultuado e estranho século."
                                                                                      Jorge Luis Borges
                      

      
Franz Kafka nasceu a 3 de julho de 1883 na cidade de Praga, Boêmia, então pertencente ao Império Austro-Húngaro (hoje Republica Tcheca). Era o filho mais velho de um casal de comerciantes judeus. Formou-se em direito na antiga universidade alemã em 1906, trabalhou como advogado, a princípio na companhia particular Assicurazioni Generali e depois no semi-estatal Instituto de Seguros contra Acidentes do Trabalho. Ele foi marcado por uma série de fatos íntimos, observados na biografia que Max Brod escreveu sobre o autor: os desentendimentos com o pai, a solidão, os estudos de Direito, as horas no escritório, a profusão de manuscritos, a tuberculose.


     Alternando temporadas em sanatórios com o trabalho burocrático, nunca deixou de escrever. Publicou pouco, e embora já no fim da vida tenha pedido ao amigo Max Brod que queimasse os seus escritos, não foi atendido, e foi através dele que sua obra chegou até nós.


     Viveu praticamente a vida inteira em Praga, exceção feita ao período final (novembro de 1923 a março de 1924) passado em Berlim, onde ficou longe da presença esmagadora do pai, que não reconhecia a legitimidade da sua carreira de escritor.


     A maior parte de sua obra - contos, novelas, romances, cartas e diários, todos os escritos em alemão - foi publicada postumamente. Falecido no sanatório de Kierling, perto de Viena, Áustria, no dia 3 de junho de 1924, um mês antes de completar 41 anos de idade e, quase desconhecido em vida, o autor de O Processo, O Castelo, A Metamorfose e outras obras primas da prosa universal, é considerado hoje - ao lado de Proust e Joyce - um dos maiores escritores do século.
Kafka também conseguiu formalizar uma obra literária que abriga leituras totalmente relacionadas com a condição do ser humano moderno.

Suas obras criticam coisas como a opressão burocrática das instituições, a arbitrariedade da "justiça" e a fragilidade do homem comum frente a problemas insolúveis, gigantescos, e que permeiam a realidade do ser humano moderno.

(Modesto Carone)

Cronologia:

1883 - 3 de Julho - Nascimento de Franz Kafka, em Praga.
1893 a 1901 - Escola comunal e Liceu alemão de Praga.
1901 - Inicio dos estudos de Direito na Universidade Alemã de Praga.
1903 - Inicio da amizade com Max Brod.
1906 - Estágio no escritório do advogado Richard Lowy, em Praga.
           8 de junho - Doutorando em Direito.
           1 de outubro - Estágio no Tribunal Correcional de Praga.
1907 - Emprego na Companhia de Seguros "Assicurazione Generali"
1908 - Emprego na Companhia de Seguros Operários.
1909 - Publicação de parte da "Descrição de um Combate", na revista Hyperion.
1910 - Início do Diário.
           outubro - Viagem a Paris, com Brod.
1911 - Contato com grupos teatrais judeus sob a direção de Lowy.
1912 - Início de "Amerika"
           agosto - Conhecimento de Felice Bauer
           setembro - "A Sentença".
1913 - Publicação de "Contemplação" - "A Metamorfose".
1914 - maio - Noivado com Felice Bauer
           julho - Rompimento do noivado.
           agosto - Declaração da 1ª Grande Guerra - escreve "O Processo" e "A Colônia Penal".
1915 - Reconciliação com Felice Bauer.
           outubro - Prêmio Fontane de Literatura.
1916 - Faz menção a várias novelas.
1917 - julho - Segundo noivado com Felice Bauer - Escreve "Aforismos."
           agosto - Primeira hemoptise.
           dezembro - Ruptura definitiva com Felice Bauer.
1918 - "Médico Rural", "Muralha da China".
1919 - Publicação de "Médico Rural" - Escreve a "Carta ao Pai" - Publicação de " A Colônia Penal".
1920 - Início da correspondência com Milena Jesenská - Pollaková.
1921 - Início de "O Castelo".
1923 - Rompimento com Milena.
           setembro - Uni-se a Dora Dymant em Berlim.
           Estudos de Hebreu - escreve "Josefina", "A Toca", "Investigações de um Cão" e "O Artista da Fome".


1924 - março - Estado crítico de saúde, regresso a Praga. - Clínica Professor Hajek em Viena.
           abril - Sanatório de Kierling - últimos retoques em "O Artista da Fome". - Resposta negativa sobre o casamento, do pai de Dora.
           3 de junho - Agonia e morte.



  

 

                                   FRAGMENTOS DE ALGUNS CONTOS DE KAFKA

   A SENTENÇA

“... pensava no amigo que fugira para a Rússia a alguns anos passados por sentir-se insatisfeito com as perspectivas em seu país. Desta forma ele consumia-se inutilmente num país estrangeiro, e aquela barba esquisita que passara a usar não ocultava as afeições que Georg conhecia tão bem desde a infância, e sua tez tornara-se tão amarelada, fazendo suspeitar a existência de qualquer doença ainda não declarada.

... talvez durante a vida de sua mãe, a insistência de seu pai em dirigir os negócios ao seu modo, evitara que ele desenvolvesse uma iniciativa própria...

... e foi assim que por três vezes e em três cartas escritas num intervalo de tempo bastante longo, falara ao amigo sobre o noivado de um homem sem importância, com uma jovem também insignificante, até que bem ao contrário do que imaginara ele começava a mostrar-se interessado neste acontecimento insigne.

... talvez até me invejasse e certamente sentir-se ia desgostoso, e não podendo fazer nada para aliviar este sentimento teria que partir sozinho mais uma vez.
Sozinho... sabe o que isto significa?

... entretanto, seja como for, faça apenas o que melhor lhe aprouver, sem pensar nos meus interesses mas unicamente nos seus.”

Trad: Syomara Cajado

AS PREOCUPAÇÕES DE UM CHEFE DE FAMÍLIA - ODRADEK

“Evidentemente ninguém se dedicaria a tais estudos se não houvesse uma coisa chamada Odradek.

A peça inteira parece ser um tanto irracional, mas a seu modo perfeitamente bem acabada. Seja como for, uma observação mais minuciosa não é possível, uma vez que Odradek é incrivelmente ágil, não se conseguindo agarrá-lo.

...ele é tão minúsculo que não se pode evitar tratá-lo antes como uma criança.
- Como se chama? – pergunta-lhe.
- Odradek.
- E onde mora?
- Não tenho moradia fixa – responde e ri; (...) E a conversa geralmente termina aí. Até mesmo as respostas nem sempre são obtidas.

Ver-me-ei então forçado a imaginar que sempre estará rolando pelas escadas, com pedaços de fios arrastando-se por trás dele, bem em frente aos pés dos meus filhos, e dos filhos de meus filhos?”

Trad: Syomara Cajado


O TRAPEZISTA

Primeiras Atribulações:

“...Nosso trapezista organizara sua vida de tal forma que enquanto trabalhando no mesmo local, nunca descia de seu trapézio quer de dia ou de noite.

Uma vez que viajavam juntos, o trapezista sonhava deitado em seu porta-bagagens; o empresário do outro lado, reclinado em seu banco, lia um livro, quando o artista dirigiu-se a ele em voz baixa. Imediatamente abandonou a leitura dispensando-lhe toda a atenção. E ele mordendo os lábios comunicou-lhe que no futuro queria exibir-se em dois trapézios em vez de um só, devendo um ficar em frente ao outro... acrescentou que nunca mais e em quaisquer circunstâncias , apresentaria seu número em um só trapézio e só a idéia de que aquilo pudesse acontecer, fê-lo estremecer. “com uma só barra nas mãos... como posso continuar vivendo...”

... e o empresário chegou a acreditar que podia ver naquele sono aparentemente tranqüilo que sucedera ao acesso de choro, as primeiras rugas de preocupação sulcadas na testa lisa e infantil do trapezista...”

Trad: Syomara Cajado


O JEJUADOR

“...Sentia-se quase feliz ante a perspectiva de passar uma noite em claro com aqueles observadores; estava sempre pronto a corresponder às suas piadas, a contar-lhes histórias de sua vida nômade, enfim qualquer coisa para mantê-los acordados, demonstrando-lhes assim que em sua gaiola não havia nenhum comestível, e que jejuava como nenhum deles podia fazer..”

Trad: Syomara Cajado


NA COLÔNIA PENAL

“ ....Muitas perguntas preocupavam o explorador, mas ao olhar para aquele homem, limitou-se a perguntar:
- Ele tem conhecimento da sentença?
- Não – respondeu o oficial aflito por continuar sua exposição, mas o outro o interrompeu.
- Não conhece a sentença que lhe foi imposta?
- Não – tornou a dizer o oficial e fez uma pausa como para deixar o outro elaborar sua pergunta, e em seguida falou:
- Não haveria motivo para contar-lhe, ele a conhecerá em seu próprio corpo...
...E assim durante doze horas repete-se este processo, e a inscrição vai-se aprofundando cada vez mais na pele...
...Nesta ocasião a grade já o terá perfurado suficientemente, atirando-o então para dentro da fossa, na qual permanecerá caído por cima do sangue, da água e dos pedaços de algodão. E assim tudo estará terminado e o soldado e eu o enterramos...”

- Trad: Syomara Cajado





                  

 

                                           KAFKA E "O PROCESSO"

    
              Franz Kafka começou a escrever O Processo (Der Prozess) na semana de agosto de 1914. Pouco tempo antes, ele duvidava de qualquer empreendimento literário novo, pois numa entrada dos Diários, de 6 de agosto desse ano, afirmava ter perdido “para sempre” a capacidade de dar livre curso à representação de sua vida interior. Embora assinalasse, logo em seguida, que havia conseguido escrever “quatro páginas, insignificância difícil de superar”, o tom mudou muito no dia 15, quando anotou o seguinte: “Estou escrevendo desde há alguns dias [...] Não me sinto, hoje, tão protegido[...] pelo trabalho como há dois anos, mas adiquiri um sentido – minha vida regular, vazia, insensata de celibatário, tem uma justificativa”. A comparação é com o ano de 1912, quando surgiram, em sucessão rápida, O veredicto, A metamorfose e a maior parte do romance O desaparecido.. Por aí fica claro que o escritor estava empenhado num projeto de envergadura. Seis meses mais tarde no entanto, - em 17 de janeiro de 1915 – ele interrompia a escrita de O Processo , pois no dia 18 os diários registram que havia começado uma “nova história” (provavelmente Blumfeld) temendo estragar as “antigas”. Aliás ainda no dia 6 de janeiro de 1915, ele se confessara quase incapaz de dar prosseguimento ao romance, afirmação reiterada numa carta de 20 de março à nova Felice Bauer, dizendo que já fazia dois meses que experimentava a impossibilidade de realizar qualquer trabalho suportável.


            Esses dados não explicam mas informam, porque um dos maiores romances deste século ficou sendo um fragmento.
Um dos tópicos recorrentes, da pesquisa em torno de O Processo é o que diz respeito às suas fontes literárias imediatas. Nesse contexto, há quem considere matrizes temáticas da obra tanto peças do Teatro lídiche, (a que o escritor assistiu no inverno de 1911-12), como alguns romances de Dostoiévisky. Segundo um especialista, a cena seminal de O processo, - a detenção do herói Josef K. – corresponde a uma sequência breve, mas significativa, do vice-rei de Fayman: a prisão de don Sebastían. Embora na peça o episódio seja muito sério, ele aparece entrelaçado com elementos cômicos, manifesto nos insultos que Pedrillo, criado de don Sebastían, profere contra os agentes da detenção – dois servos mascarados, a serviço da Inquisição, que vêm prender o personagem por suspeitas de que ele seja judeu.


          A comicidade do capítulo primeiro de O processo, em que se narra a detenção de K.é menos evidente, mas sabe-se que kafka riu até chorar quando o leu, para os amigos precisando interromper a leitura, para enxugar as lágrimas: para ele o cômico radicava no acúmulo de minúcias.


         Processo, lei, aparelho judiciário e burocrático, são motivos que atravessam a obra de Kafka. Ele soube tratá-los com precisão técnica e terminológica, não só porque era formado em direito, mas também porque atuou pessoalmente em numerosos processos envolvendo a companhia semi estatal de seguros contra acidentes de trabalho., da qual foi funcionário exemplar durante anos. Acresce que- conforme demonstra sua correspondência- acompanhou com interesse várias “causas momentosas” na época de O processo, as quais, entre outras coisas, lhe proporcionaram uma oportunidade para ver um pouco atrás da fachada de respeitabilidade burguesa da sua cidade e de seu tempo.


        Para citar alguns exemplos, na primavera de 1910 ele refere à Max Brod , o processo de homicídio movido contra uma condessa, que causou sensação em Praga; Em novembro de 1912 envia, numa carta à noiva Felice Bauer, um recorte de jornal sobre um “ processo monstruoso”; Numa entrada dos diários, de julho de 1913, afirma ter soluçado sobre o relato judicial de uma jovem de 23 anos que, premida pela miséria e pela fome, estrangulou um filho de três anos com uma gravata que lhe servia de liga. É provável, porém, que a causa que mais inspirou no período em que concebia O processo tenha sido a de um deputado de direita que, em março de 1914, ao ser denunciado pela imprensa liberal como informante pago da polícia secreta de Praga junto ao governo de Viena, apresentou queixa-crime ao tribunal competente para se defender. O caso causou furor nos círculos políticos e culturais na Boêmia; o deputado foi tão pouco eficiente na defesa, que o público se convenceu da sua culpa antes que viesse à luz o pronunciamento judicial exigido por ele. Em audiências realizadas em maio, sua queixa foi rejeitada; o veredicto decretou o declínio político e moral do acusado, que acabou mudando de nome e caiu no esquecimento. Foi nessa ocasião - poucos meses antes de iniciar O processo – que Kafka travou conhecimento concreto com as tramas da polícia do Império, com os procedimentos sinuosos da justiça criminal de seu país e principalmente com a figura tragicômica do deputado, que se viu arrastado contra a vontade à um processo cujo o desfecho ele sabia de ante mão ser a sua ruína.


       As interpretações do romance, cujo o número, nas mais variadas vertentes (teológicas, filosófica, sóciopolíticas, piscanilíticas, estético-formais, etc), aumenta à medida que se amplia a posição de Kafka como um clássico da literatura universal. Por exemplo: Na linha teológico- existencial, há um número bem numeroso de interpretes que vêem no romance a representação da culpa do homem contemporâneo, já que o livro não trata de um processo criminal que se desenrole diante uma corte de justiça convencional. Outros , pela mão contrária, descartam qualquer viés alegórico desse tipo e afirmam, baseados na história , que nada é mais real (ou realista) que O processo, pois o entrecho reflete a desumanização burocráti ca da Monarquia do Danúbio. Os que não concordam com essa tese, entretanto, argumentam que a administração austro-húngara, nada tinha em comum com as imagens de O processo, além do que a avaliação da burocracia, feita pelo Kafka funcionário público, não era a de um súdito impotente diante de uma máquina impessoal e aniquiladora. Mas há críticos que consideram de outra natureza o realismo de kafka – para eles o escritor habilitado a oferecer, apartir do seu ângulo específico de observação histórica, uma visão estéticamente eficaz e nada metafísica do que ainda estava por acontecer; Por isso, O processo pode ser concebido como uma profecia do terror nazista, em que a detenção imotivada, os comandos de espancamentos, as decisões incontrastáveis das esferas de poder e o assassínio brutal faziam parte do cotidiano. Seguindo uma linha análoga de raciocínio, que procura pôr em evidência a lucidez de um autor “desengajado” (e podado pelo Stalinismo) constam também da bibliografia análises que percebem no romance o esforço bem – sucedido de mapear por dentro a alienação encoberta do dia a dia através das peripécias de K. pelas instâncias reificadas do mundo administrado. Vistos desse ângulo, “protocolos herméticos” como O processo desvendam a gênese social da esquizofrenia. Ou então um universo sem esperanças de onde foi banido o mito da salvação.


      Já na vertente psicológica ou psicanalítica o leitor encontra afirmações no sentido de que a ação romanesca de O processo reflete um caso de neurastenia, ou então que as desventuras objetivas de K. são apenas um sonho quando não a imagem delirante de um indivíduo entregue ao isolamento e à exaustão. Uma vez porém que a história é narrada da perspectiva do personagem, não faltam os que reconhecem, nos acontecimentos do livro, ora um mundo de aparência, ora um mero “processos de pensamento” de Josef K. O contraste entre essas teses dá uma idéia do que ocorre na fortuna crítica do romance- a tal ponto que sua plausível pretender, como fazem alguns estudiosos, que questões relativas ao “sentido” da obra continuam em aberto.


     Certamente o motivo para tanta discrepância nas interpretações de O processo, reside nos meandros de uma prosa sutil. Pois a despeito do seu aspecto “conservador”, ela marca um momento da maior complexidade no âmbito da ficção universal. Tome-se como exemplo, a famosa frase com que se inicia o romance (na tradução: “Alguém certamente havia caluniado Josef K. pois uma manhã ele foi detido ser te feito mal algum”). Um exame superficial desta sentença mostra que são conhecidas todas as regras sintáticas e as palavras que, através dela, ordenam e objetivam seu conteúdo. Mas para quem continua lendo a história, o sentido da ação que se segue não é nem confirmado, nem revogado: é simplismente posto em dúvida. Dito de outro modo, o que de início está formulado de maneira válida, como consequência de uma tese (detença por presumível calúnia ) , acaba se tornado algo totalmente incerto, com efeito, a lei que serve de parâmetro para medir a culpa de K. permanece oculta, não podendo patrocinar qualquer juízo ponderável sobra a conduta do herói. Além disto no desdobramento da ação, consta que as autoridades são” atraídas pela culpa”, o que leva a supor que a detenção não precisa ser resultado de uma calúnia. Acrecenta-se que a liberdade de movimentos do protagonista, depois de alguns quiproquós, fica garantida – o que faz a “detenção” deixar de ser o que o começo do capítulo afirmava que era. É por essa via kafquiana que o fato afirma do perde a credibilidade, sem que seja oferecida ao leitor uma alternativa plausível. As coisas pórém não param aí, porque Kafka concebia a abertura da narrativa como um golpe de mestre, na medida em que ela não só dá o tom do que é narrado, como também baliza a lógica interna do relato. Não suspreende de que o modo como a frase inaugural do romance se comporta diante da primeira cena se repita, com maior ou menor carga de contraste, tanto em relação às demais cenas do capítulo primeiro quanto aos restantes que compõe o corpo da obra.     

     Um passo adiante é por meio de representações conhecidas como inquerito, cartórios, escritórios de advocacia que se vêem incoporados no texto elementos convencionais da prática jurídica – embora todos eles sejam postos em questão através de detalhes que, no conjunto, descrevem uma linha ascendente de autodescrédito e inverossimilhança: o inquérito, por exemplo, tem lugar no quarto dos fundos de uma casa de cômodos miserável, os cartórios estão instalados em mansardas infectas, o advogado recebe clientes na cama etc- o que não impede que no final, Josef K. seja executado, só que por dois carrascos vestidos de sobrecasaca, gordo como tenores, que usam uma faca de açogueiro, numa pedreira situada nos confins da cidade. Diante de tudo isso, a postura racional do leitor , em princípio estimulada pelo teor quase naturalista do texto, é incessantemente agredida por deslocamentos, sem que a coesão interna do romance dê margem a dúvidas sobre sua integridade enquanto expressão do pensamento organizado. Se a pretensão de Kafka era fazer o leitor se sentir “ mareado em terra firme” (as palavras são suas), então ele conseguiu o que queria escrevendo O processo.




                            

 

                                       "K" (1984)

      “K” absorve e manifesta ao público a essência do espírito kafkiano, denunciando a situação do homem como vitima de mecanismos estranhos criados pela sociedade. O personagem central é inicialmente tratado como animal em fase de adestramento. Em tal quadro, fica claro o triângulo edipiano que vai se repetir sob outras formas e a presença da repressão que se inicia a partir do berço, através da presença dos pais que preparam o homem para o ridículo e complicado mundo social.

     Uma vez integrado ao contexto do faz de conta burocrático e cercado de pessoas nas quais as anomalias parecem naturais, o personagem acaba devorando pela máquina do absurdo, alimentando-se de documentos e diplomas tão desnecessários. Entre uma fuga e outra, ele sonha com a magia da liberdade total e acaba novamente prisioneiro entre as paredes da fria e inevitável realidade, vitima da violência do próprio sistema. A temática e atualíssima, mais do que nunca enfrentamos os obstáculos de ordem social, política e burocrática, graças aos quais todo um povo se decepcionam, frustrado em suas esperanças mais legitimas. O elenco está homogêneo e a presença dos músicos como integrantes do cenário dá ao espetáculo um visual agradável e onírico. É um trabalho sério de jovens vanguardistas que anseiam rasgar fronteiras rumo à totalidade e à comunhão das artes.



FICHA TÉCNICA

Roteiro e direção
Ione Medeiros

Coordenação geral
Rufo herrera

Elenco
Ione Medeiros
Conceição Nicolau
Manuela Rebouças
Myriam Tavares
Bernardo Pedroso

Músicos
Cláudio Urgel Pires Cardoso(violoncelo)
Lindolfo Bicalho (violão)
Paulo Sérgio Guimarães Álvares (piano)

Contra regra
Mauro Lúcio Xavier

Apoio
Goethe Institute
Fundação de Educação Artística







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Foto:Guto Muniz
Foto:Guto Muniz
Foto:Guto Muniz
                                                                                                                                                                
Foto: Joana D’arc

 

                                                                                                                                    

 Foto: Joana D’arc